Ahhh Saudade...

"Saudade é um bem que faz doer, difícil de esquecer e que não tem idade"... Sempre lembrei desse verso de música como verdade absoluta, mas não termina ai. A saudade que todos os brasileiros se orgulham de ser só nossa, tem ponta que fere ao mesmo tempo que acalenta. Quando eu sinto saudades de alguém deixo ela me levar aos mínimos detalhes. Gosto de sentir o cheiro, lembrar das palavras, do silêncio em que olhares falaram mais, enfim gosto de revivê-las ao vivo. Mas não.

A saudade está ai para nos lembrar extamente que não é mais possível. Essa semana pensei nos meus avós. Este é o primeiro ano que termino sem um representante desse parentesco vivo. Estava na cama fervilhando pensamentos diversos e me vieram eles. Primeiro vô João e vó Eneida. Pensei nos últimos sonhos que tive com minha avó, como ela estava próxima de mim fazendo estripulias como uma cambalhota na escada e guardando o dinheiro do taxi no sutiã. Como ela era sãopaulina e me fez amar ainda mais esse time.



Depois pensei no vô Oriovaldo e na vó Edera. Tentei lembrar de cada detalhe que vivi com eles especialmente quando moravam na praia. Viajei pelos móveis da casa, os cantos onde eu brincava escondido e estava cercado de anjos a conversar comigo. Lembrei das comidas e do jeito do meu vô para falar e fazer brincadeiras e pegadinhas o tempo todo, de como ele ria de si mesmo com um gosto absurdo. Essa saudade é deliciosa. Além de me fazer reviver esses momentos, me faz tê-los comigo sempre. Fazendo parte da minha vida e de tudo que eu sou.

Mas como eu disse, existe a saudade que mora ao lado. Que fere ao som de uma música, com a lembrança de um olhar, com um sentimento que jamais deixou de existir, nem antes, nem depois. É a saudade viva. Saudade das pessoas que estão perto e por algum motivo longe. Essa saudade dói porque não esconde seus espinhos. Machuca carne, alma e coração.

Quando bate forte não dá pra segurar as lágrimas. Aquela vontade de sair gritando seu nome, querendo saber onde está e por quê não está mais aqui. E a pessoa só vai existir mesmo nessa dolorida saudade. O orgulho ferido não deixa você ir atrás dela, e ela não vem atrás de você.

A saudade assim vai envelhecendo. Ocupando gavetas cada vez mais fundas e profundas na alma e na mente. Vai se tornando um vidro esfumaçado e frio onde você mesmo rejeita uma visita. Se torna uma imagem mental agradável e dolorida. Profundamente dolorida, mesmo assim, a saudade não se esvai, nem muda de intensidade, nem de cor ou sabor. Continua irremediavelmente viva. Te fazendo vivo também.

Um dia na verdade ela vai morrer. Matar a saudade é algo sublime. Feito para se degustar redescobrindo cheiros, gestos e sorrisos. Leva tempo também, tem aquelas que não se acabam naquele momento e tem aquelas que encontram na eternidade o acalento. Quando estou com saudade fico chato. Quero grudar na pessoa feito bicho preguiça e não perder um momento sequer desse reencontro. Gosto de matar a saudade de canudinho, pra sugar tudo que ela sugou de mim.

Espero poder sentir todas as saudades que couberem no meu peito para aprender todo dia com elas. Sem melancolia, apenas fortalecimento de tudo o que eu sou porque em cada saudade existe algo de mim que ficou lá e algo de alguém que trouxe comigo, especialmente dos meus ancestrais, dos meus amores e de mim mesmo.

Comentários

Unknown disse…
Adorei...ótimo texto!!
Tema mara...e me deu até saudade de algumas pessoas...
Unknown disse…
Gostei muito do texto inteiro, mas adorei este trecho: "Gosto de matar as sds de canudinho pra sugar tudo que ela sugou de mim ..."
Unknown disse…
Gostei muito do texto inteiro, mas adorei este trecho: "Gosto de matar as sds de canudinho pra sugar tudo que ela sugou de mim ..."

Postagens mais visitadas deste blog

O homem nasce, cresce, fica bobo e casa. Como se não bastasse, procria.

Bom dia sem Rita

My Name is not João!